terça-feira, 3 de janeiro de 2017

Paradise Trips

"Paradise Trips" (2015) dirigido por Raf Reyntjens, conhecido pelos vídeos musicais, como "Papaoutai", de Stromae, coloca em evidência conflitos geracionais, apesar do tema não ser novidade a maneira com que é apresentado faz toda a diferença. É forte, direto e calibra bem o drama com o humor.
Mario (Gene Bervoets) é um motorista de ônibus de férias, que tem sua própria empresa de viagens 'Paradise trips'. A beira de sua própria aposentadoria, Mario tem que levar um grupo de alternativos para um festival psicodélico na Croácia. A viagem logo se transforma em uma viagem fascinante que confronta Mario com seus próprios preconceitos e seu filho (Jeroen Perceval) há muito tempo perdido.
Gravado num festival de música eletrônica na Croácia, eles não deixaram que os visitantes soubessem que ali estava sendo rodado um filme, contrataram figurantes que dançassem em torno e a festa em si ficou ao fundo dando a atmosfera esperada. Uma forma ousada de se gravar um filme, os visitantes reais da festa sempre estão distantes e desfocados, o acampamento foi construído antes do festival começar e com o início da festa as outras tendas foram armadas ao redor. 
Mario topa levar o grupo a um festival, mas quando vê que são hippies se fecha, pois isso lhe traz à memória seu filho, que anos antes denunciou para a polícia por tráfico de drogas, a relação foi cortada e a sua mulher se comunica com o filho escondida, ele não sabe que tem um neto, ao chegar no local conhece algumas pessoas e como sempre os julga vagabundos, por coincidência seu filho está lá também, nesse ponto já está envolvido com um menino que não curte muito aquela vibe e que vem a saber depois que é seu neto. O filho não gosta da ideia de ter seu pai lá e não quer encontrá-lo, mas chega um momento que precisam conversar. 
Há cenas inspiradíssimas regadas a uma viagem psicodélica produzida por cogumelos, Mario encarna o Super Mario Bros, personagem querido por seu neto, recém-descoberto. Muito hilário, e é a partir daí que a mudança começa a surtir efeito, ele se descaracteriza, alivia o semblante e fica disposto a dialogar com o filho.

É uma história dolorosa, mas que traz uma bela transformação de um personagem preconceituoso e turrão, a forma que isso acontece é bonita e gradativa e a relação entre pai e filho não é reconstituída forçosamente.
Gene Bervoets faz um homem cheio de julgamentos e preconceitos, impenetrável. Não expressa amor e tudo lhe parece errado, a vida que o filho leva, por exemplo, fora do padrão capitalista o deixa irritado, e por isso o nega, até que essa festa os aproxima inusitadamente, a convivência com variadas pessoas durante uma semana neste local vai o tornando menos austero, percebe que há inúmeras maneiras de ser feliz, que tudo não precisa ser do jeito que pensa que é. As pessoas escolhem seus caminhos e é assim que deve ser. Ao fim, num diálogo com o filho, ainda muito resistente ao contato do pai, expressa o como a mente desse homem se tornou mais aberta e, consequentemente, o deixando mais leve e pronto para começar a demonstrar amor. O filho apesar das diferenças parece-se com o pai na teimosia e com uma simples frase também expressa que, talvez, esteja aberto para um recomeço. Tão sutil e tão significativo, sem clichês, é direto e real.

"Paradise Trips" tem nuances encantadoras, emociona ao mesmo tempo em que nos tira sorrisos, é inteligente no desenrolar e competente ao passar a mensagem. Coroado por interpretações enternecedoras, e claro, sem deixar de evidenciar a trilha sonora potente que contrapõe com o universo interior de Mario, que aos poucos adentra nessa atmosfera quebrando diversos paradigmas. Um ótimo filme sobre conflitos de geração.

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