terça-feira, 18 de novembro de 2014

Blind

"O que é real não é importante, contanto que eu consiga visualizá-lo."

Eskil Vogt é um roteirista de mão cheia, vide seu ótimo trabalho "Oslo, 31 de Agosto" (2011), a sua estreia como diretor só ressalta seu talento em criar narrativas.
"Blind" (2014) é um filme que envolve e mergulha fundo na personagem, a linha entre realidade e imaginação é extremamente tênue e por muitos momentos ficamos em dúvida, isso se dá porque Ingrid (Ellen Dorrit Petersen) é escritora e devido a sua nova condição não tem vontade de sair de casa, ela segue os dias refletindo e imaginando situações. Ingrid perdeu a visão e tenta se adaptar, no início assim como ela tentamos entender esse novo mundo que se apresenta, ela busca lembrar de coisas que tenha visto bastante, lugares a que tenha ido com frequência, refaz essas imagens na cabeça, a lembrança é uma grande aliada, mas mesmo assim detalhes fogem e por conseguinte tropeços são inevitáveis.
Ingrid tem receio de sair pelas ruas e imagina diversas situações das quais mais tem medo, como atravessar a rua. A descrição que faz sobre estar cega é impressionante, ela passa a viver um outro mundo, não mais o vê, apenas o imagina. Ingrid mora com o marido Morten (Henrik Rafaelsen), fantasias a respeito com quem ele se encontra ou dele estar perto dela a observando é constante. Ao exercitar sua escrita concebe dois personagens, Elin (Vera Vitali), uma mulher triste, sozinha e que sofre pela ausência do filho, pois o ex-marido o puxa cada vez mais para ele, e Einar (Marius Kolbenstvedt), também solitário e viciado em pornografia, ele se apaixona por Elin, mas não consegue a aproximação. Ingrid vai tecendo histórias envolvendo esses personagens, e coloca seu marido em diversas ocasiões também, como criar um encontro entre ele e Elin. O desenvolvimento do longa é leve e tudo se entrelaça no final, Ingrid confunde-se com seus personagens, o que simboliza seu estado de espírito, a metalinguagem nessa parte atinge seu ponto máximo.

Interessante observar que a auto-estima de Ingrid vai caindo, ela acha que o marido tem pena, e não tem vontade de fazer sexo com uma "invalida". Cenas em que imagina ele a observando a invadem, a insegurança é muito bem trabalhada e seguimos junto com a personagem neste novo mundo que veio a ela tão bruscamente.
Realidade e imaginação se misturam com muita beleza nos revelando solidão e medo. Há momentos que fica difícil definir se algumas coisas são fragmentos do que aconteceu, ou somente são fantasias criadas. Em termos de narrativa esse filme apresenta uma criatividade absurda sem deixar a sensibilidade de lado. Recomeços são complicados, somos tão limitados e perder a visão é terrivelmente assustador.
"Blind" chega bem perto da realidade ao retratar a perda da visão e dos sentimentos que causam, o impacto da escuridão, a insegurança, o medo, a adequação, uma complexidade enorme acomete, pois exige-se muito esforço psicológico. Percebe-se e sente-se tudo de outra maneira.

A visão nos permite distinguir belezas, cores, formas, porém acaba por ser tornar limitada, enxergamos somente o que nos convém, perde-se detalhes e pontos de vista. A cegueira desperta outros sentidos, a audição e o tato ganham valor extremo e as percepções se tornam mais intensas. O valor que atribuímos aos nossos sentidos não equivale ao que nos proporcionam, pois tudo se volta somente para a razão nos distanciado da realidade que se faz invisível.
"Blind" oferece muitos sentimentos a quem o assiste, várias questões e nuances são apresentadas, além de ter uma atuação marcante de Ellen e uma trilha sonora que compõe perfeitamente com todo o contexto.

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