segunda-feira, 14 de abril de 2014

Samsara

"Samsara" (2001) de Pan Nalin é uma "história de amor espiritual" filmada nas imponentes locações geladas do Himalaia. É sobre experiências e decisões. O foco está nas buscas empreendidas por duas pessoas diferentes. De um lado, um homem procura pelo esclarecimento espiritual por meio da renúncia ao mundo real. De outro, uma mulher quer encontrar esclarecimento no amor e uma nova vida inserida no mundo. Essas duas buscas em determinado momento se cruzarão e conectarão irreversivelmente a vida dos personagens. Tashi passou três anos meditando, ao sair da reclusão e recuperar suas forças, questões surgiram em sua mente, principalmente quando vai ao vilarejo próximo e se apaixona por Pema. Não conseguindo controlar seus instintos deixa o mosteiro e vai atrás de sua amada.
"Samsara" é uma palavra de origem sânscrita que significa "fluxo incessante de renascimentos através dos mundos". A maioria das tradições considera Samsara uma condição a ser superada, pois os ciclos se repetem apenas no homem que não atingiu sua iluminação.
O maior conflito do ser humano é lidar com os desejos, não existe felicidade plena, estes desejos nos levam para a dor e o sofrimento, mas é a partir daí que evoluímos e adquirimos uma consciência mais elevada. Buda teve uma vida mundana antes de alcançar a iluminação e isso foi indispensável para conseguir chegar a tal patamar: Anular desejos. Em determinado momento, Tashi questiona seu mestre sobre a liberdade que lhe prometeu quando entrou ainda criança no mosteiro, e termina dizendo: "Tem coisas que devemos desaprender para poder aprendê-las. E tem coisas que precisamos possuir para poder renunciá-las."
Tashi segue em busca de seus desejos, começa a trabalhar na propriedade do pai de Pema e logo eles se envolvem. A grande pergunta é: Será que Tashi apenas queria satisfazer seus desejos sexuais, ou houve um amor verdadeiro? Dentro da aura do filme acredito que Pema foi essencial para o desenvolvimento espiritual de Tashi, assim como Yashodhara foi para Siddhartha (o primeiro buda). E o filme nada mais é que o retrato desta história. Podemos contemplar um diálogo riquíssimo entre Tashi e sua esposa sobre o papel da mulher no budismo. Pema foi deixada com o filho e Tashi seguiu de volta ao mosteiro, ele constatou que tudo não passava de uma ilusão. Quando seu mestre Apo falece, começa a pensar em todas as decisões e percebe o que realmente sua alma necessita. Outra frase que permeia o filme e explica muito: "O que é mais importante, satisfazer mil desejos ou conquistar apenas um?". Qual a vantagem em se conquistar mil desejos, se estes não passam de ilusões e felicidades momentâneas?

Siddhartha talvez tenha conseguido chegar a iluminação graças a Yashodhara, mas quem se lembra dela? Foram através das experiências ditas mundanas que ele conseguiu experimentar o amor, o sofrimento e todos os sentimentos que acometem as pessoas, vivenciou uma tórrida paixão, a paternidade, o trabalho braçal, e desejos menores que parecem serem maiores que tudo. Mas Yashodhara já era compassiva, e então porque ela não se tornou um buda? Ao fim, acabou sozinha, com um filho e renunciou a tudo, ou seja, ela também alcançou a iluminação.
"Samsara" conta uma bela história e nos mostra essa parte esquecida, a da mulher de Siddhartha. É um filme grandioso, com uma fotografia exuberante e cenas extasiantes. Uma obra-prima!
É impossível colocar todas as nuances do filme em um texto, é preciso vê-lo e mais de uma vez, acredito que seja de grande aprendizagem a nós que fazemos parte de um fluxo constante, estamos aprendendo a cada minuto, o importante é ter essa consciência e amadurecer nossa mente e espírito. Melhorar nas pequenas coisas cotidianas já é um avanço, saber escutar, ficar calado, questionar, compreender o outro, eliminar sentimentos mesquinhos. O essencial é buscar conhecimento e passá-lo adiante.

O filme tem uma abordagem interessante sobre o budismo que aqui no ocidente tende a ser distorcido em alguns aspectos. É de uma beleza sem tamanho, a paisagem já demonstra a amplidão que permeia a história e os conceitos. A cultura é belíssima!
Tudo é um ciclo, até que entendamos os verdadeiros valores e nos livremos das insignificâncias, assim atingindo a iluminação.

Deixo a reflexão final do longa: "Como alguém pode impedir uma gota d'água de jamais secar? Atirando-a no mar."

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