segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Hora de Morrer (Pora Umierac)

Dorota Kędzierzawska é uma diretora de muita sensibilidade, em "Eu Existo" - 2005 retratou um menino cuja solidão era sua única companhia, abandonado sem saber o que fazer, tenta se encontrar, já em "Hora de Morrer" (2007) o foco é em uma velhinha. Aniela é uma enérgica inflexível relíquia do passado, como a grande casa em estilo dacha rodeada por árvores altas em que vive sozinha com sua impetuosa cadela, Filadélfia. Ela observa do outro lado da rua, um homem gordo, novo rico grosseiro, que mora em uma grande casa nova e a quem desaprova, e na esquina, uma escola de música que luta para sobreviver. Todo mundo quer a casa e o terreno de Aniela. Quando o vizinho auxiliado pelo filho interesseiro de Aniela, traça planos para obter a propriedade, ela encontra uma maneira de ser mais esperta que eles.
Vivendo somente com sua cadela, da qual mantém diálogos interessantes e intimistas, Aniela segue seus dias só em sua grande linda casa, mas que está caindo aos pedaços, essa casa é sua paixão, pois foi onde passou toda a sua vida, incluindo o período da guerra. Todos a criticam e desejam tirá-la de lá, principalmente seu filho, que quer vendê-la para o morador rico ao lado. Várias tentativas acontecem, mas com o desenrolar Aniela mostra que não é porque está velha que não pode decidir sobre suas próprias coisas.
A cena inicial é muito realista, Aniela é mal recebida por uma médica, aliás ela nem chega a entrar no consultório. A médica diz: "Tira sua roupa e deita aí" de forma ríspida, sem nem olhá-la. Inconformada ainda pergunta novamente o que foi que disse; a médica lhe diz o mesmo, e então a velhinha solta um palavrão e vai embora. Nas ruas pensa sobre o ocorrido, e não entende como alguém formado em tal profissão lhe dedica tal tratamento.
O filme em preto e branco é elegante, a fotografia salta aos olhos e os closes no rosto expressivo de Aniela ou em Filadélfia são os pontos altos. Mesmo se tratando de um filme que fala do inevitável, impossível não assisti-lo com um sorriso no rosto. Ele demonstra bem o universo solitário da velhice, a rotina permeada de esquecimentos e dos pensamentos atordoantes sobre o que virá.

Aniela observa com seu binóculo a rotina de seus vizinhos chatos, além da escola de música para crianças que fica próxima de sua casa, por vezes as crianças dessa precária escola invadem seu quintal para brincar no balanço. Em dado momento aparece um menino falante que escala até o alto da casa, sua intenção era roubar, mas ao se deparar com Aniela lhe diz algumas coisas e pede um trocado, seu apelido é Dostoiévski, que segundo ele, era um pintor russo.
O filme todo se passa dentro da casa, Aniela é muito agitada, dificilmente se deita. Todas as cenas são muitas especiais, principalmente quando envolve sua cadela Filadélfia.
Há muitas lembranças envolvendo sua juventude e passagens de seu filho pequeno correndo pela casa. Interessante que nada de sua vida nos é explicado, mas percebe-se muito fortemente que seu filho não se importa muito, e mais tarde visualizamos a tristeza de Aniela ao ver que ele está de conluio com o vizinho para adquirir sua casa. Nesta parte o desgosto toma conta de Aniela. O diálogo que o filho tem com a esposa retrata um ser humano pobre e movido apenas pelo dinheiro. Muito real também é a maneira que a neta a trata, o descaso que faz quando Aniela mostra a casa e os brinquedos da época de seu pai. Reflete a educação que a maioria das crianças recebem hoje em dia, nada de diálogos, apenas bens materiais para suprir desejos, que na verdade nunca serão satisfeitos, o que mais tarde os tornam adultos de plástico.

Dentre todas as cenas maravilhosas que este filme possui, destaco a do balanço. É como se ela se livrasse de todas as mágoas e decidisse não se importar mais, ela diz repetidamente: enlouqueci, enlouqueci, mas o fato é que ela entrou no estado de lucidez, e é o que a faz tomar uma decisão justíssima, ela se desprende totalmente do seu amor maior, a casa, e enfim descansa em paz. O desfecho é uma grande renovação.
"Hora de Morrer" é daqueles filmes que todos deveriam assistir, traz uma reflexão contundente sobre velhice, abandono, solidão e valores esquecidos.

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