sexta-feira, 3 de maio de 2013

A Criada (La Nana)

O filme chileno "La Nana" (2009) do diretor Sebastián Silva traz a história de Raquel, que trabalha há 23 anos como criada na casa dos Valdês, uma família de classe média alta de Santiago. Ela não possui amigos e destina pouco tempo de seus dias atarefados para falar com a mãe que mora longe. Raquel acha mesmo que é da família e até os Valdês chegam a brincar com o fato. Mas por mais que a brincadeira pareça divertida, a verdade é que Raquel não é um membro desta família e quando tenta o ser sem pudores, os mundos díspares entram em choque. Pilar, a patroa, não tem coragem de despedir Raquel, ela parece ter medo de enxergar a perturbação mental evidente de sua criada e tenta sucessivamente arrumar empregadas com quem Raquel possa dividir o trabalho. Pilar teima em achar que o comportamento estranho da empregada é apenas o cansaço.
Raquel é quem dá as cartas para os filhos de Pilar, eles a obedecem e tem muito carinho por ela, a não ser a filha mais velha que acha que a empregada implica demais. Pilar contrata uma moça para dividir as tarefas, mas Raquel é antipática e faz de tudo para que a moça vá embora, e é dessa maneira que prossegue o filme, entre as tramóias de Raquel para que as ajudantes não persistam no emprego. Mas o fato é que Raquel realmente está doente e necessita de ajuda, e isso muda quando desmaia e precisa ficar de repouso, então a patroa contrata uma mulher para ficar no lugar de Raquel, e a partir daí acabamos por conhecer um pouco mais dessa mulher tão retraída e fechada em si mesma.
Catalina Saavedra como Raquel nos mostra o quanto uma empregada se torna dependente de seu patrão, depois de tantos anos dando seu empenho, compartilhando o dia a dia, é inevitável que esta se torne um membro da família. O que acontece com Raquel é que ela é uma pessoa sozinha, não tem nada além do trabalho, por isso sua situação psicológica não é das melhores, ela sente ciúmes dos filhos da patroa, sente medo de perdê-los. Ela nos irrita inicialmente, mas com o desenrolar nos aproximamos do ser humano, e de certa forma nos encantamos com sua inocência.
Muitas crianças crescem sob os cuidados de babás e as têm como mães, já que muitas mulheres trabalham e têm tarefas diferenciadas, de qualquer forma esta mulher se torna algo muito importante querendo ou não, ela está criando, educando, brincando, arrumando a casa, cozinhando. Como não valorizar esta pessoa? Muitos veem isso apenas como uma função, como uma criada, a sua profissão é essa, e portanto, é uma obrigação, mas esquecem do aspecto humano e da rotina diária que se cria.

No filme Raquel começa a se descobrir fora daquela família quando vai passar o natal na casa dos parentes de sua ajudante, esta que a conquistou aos poucos com sua personalidade cativante e espontânea, muito esperta ela encontrou o ponto de Raquel. Nessa viagem ela enxerga um mundo exterior além daquele que vive todos os dias, em que consiste em acordar e já começar a arrumar. Na verdade o que ela precisava era uma faxina interna, a mudança de Raquel não é brusca, acontece sutilmente. Ao final a vemos indo correr após o expediente, em que vagarosamente vai se soltando, percebemos que é o início de uma liberdade interna, mesmo que não mude nada dentro de seu cotidiano.
O filme tem um toque de humor, mesmo que as situações não sejam necessariamente feitas para rir, Raquel apenas com o olhar nos diz muito, há muita tensão nas cenas e seu resgate pela humanidade no fim é realmente muito bonito. É uma homenagem para as empregadas domésticas que geralmente nem são lembradas, mas que são necessárias no cotidiano de muitas famílias, aquelas que trabalham há anos em apenas uma casa, se dedicando e que acabam perdendo muito de suas vidas e até se esquecem de si mesmas.

Observar o ser humano que acha que pode se sentir superior e tratar as pessoas da maneira que quiser só porque tem dinheiro, chega a ser constrangedor e ridículo. No filme vemos a família tratando bem Raquel, mas há uma certa hipocrisia nisso tudo, pois a vontade verdadeira deles é despedi-la.
"A Criada" é um filme lento, com situações parecidas, mas completamente válido em todo seu contexto.

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