quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Dogville

Dogville é uma pequena cidade com alguns poucos moradores, situada em algum lugar entre as montanhas do meio-oeste estadunidense. A história se passa durante a Grande Recessão Americana na década de 1930 e gira em torno de Grace (Nicole Kidman), uma jovem que, fugindo de perigosos gangsteres, acaba encontrando refúgio em Dogville. Encantado com a moça, o introspectivo Tom (Paul Bettany) propõe que a cidade ofereça abrigo a Grace que, em troca, faria pequenos serviços para seus moradores. Aos poucos, porém, os aparentemente amáveis habitantes de Dogville, ao descobrirem que ela está sendo procurada pela polícia, vão exibindo um lado sombrio e passam a explorar a garota, a impedindo de abandonar o lugar.
Lars von Trier criou um espaço cinematográfico simples e despojado incorporando elementos teatrais. Minimalista, o diretor utilizou objetos de cena mas nenhum cenário; apenas linhas pintadas no chão demarcando duas ou três ruas e algumas casas. O cenário invisível (sem paredes, janelas ou portas) permite que o espectador veja os coadjuvantes em seus afazeres longe do foco principal da ação. Várias análises são dadas, uma delas é a sociológica, que seria uma crítica aos EUA, no jeito como praticam a liderança sobre o resto do mundo. O filme é uma parábola moral em que mostra a desumanidade na humanidade, o lado individualista, mesquinho, hipócrita, conservador e vil. A estrutura do filme possui um prólogo que apresenta os personagens e nove capítulos. E um narrador que nos conta a história.
O dogmatismo começa a se acentuar quando a polícia começa a fazer visitas na cidade a procura de Grace. A partir desse momento, os moradores revelam o seu lado cruel. Resolvem duplicar o trabalho e tratar Grace de uma maneira insensível. É repreendida por muitos daqueles que outrora a tratavam bem. Passa a ser alvo da lascívia dos homens da cidade. O intelectual e reflexivo Tom tenta ajudá-la, mas por sua vez, suas iniciativas se mostram ineficazes. Muito discurso para pouca praticidade. Tom se revela frágil e frouxo, ao final Grace perde toda a esperança que depositou naquele que julgava amá-la. E Tom delata ela aos gangsteres. Ao chegar na cidade, o gângster que é pai de Grace a indaga se ela deseja que a cidade seja aniquilada. Eles dialogam sobre a arrogância. Grace quer o perdão para os habitantes de Dogville, como se dissesse "eles não sabem o que fazem". Seu pai que é quase como a figura de Deus a acusa por fazer a concessão de perdoar quem lhe é inferior e lhe impingiu tanto sofrimento. Grace diz que o pai é soberbo devido à sua vontade de vingança e pede poder, que lhe é concedido para salvar Dogville. Entretanto, ao sair do carro e ouvir Tom, que escreveria sobre o que se passou, ela se desilude com a humanidade e pune Dogville com o aniquilamento. A mensagem é clara ao dizer que a humanidade não tem salvação.

Demonstra-se no filme que viver em coletividade e pensar por si só é coisa difícil, e que apesar de aparentar no início uma certa aceitação, na verdade ao longo do tempo a comunidade mostra os seus dentes diante ao desconhecido que vem habitar ali, e que se este não seguir as regras devidas, será punido de alguma forma. A personagem de Nicole Kidman explica em uma cena sobre o estoicismo, que significa aceitar as leis e todo o mal que vem dela, sem questionar ou se indignar. Retrato mais que atual não? Já que vemos as pessoas se preocuparem demais em andar na linha, seguir tal regra, sem ao menos se dar conta de que aquela lei que diz protegê-la, na verdade, a repreende e a açoita. "Dogville" é um estudo muitíssimo amplo da sociedade, indivíduos, sistema, filosofia, teologia e por aí vai, é um mar de pensamentos que invadem o nosso cérebro que nos induz a pensar e refletir.
"Dogville" faz parte de uma trilogia inacabada sobre a América, o segundo filme é "Manderlay", 2005.

Lars von Trier é um dos criadores do "Dogma 95", uma espécie de cartilha em que um conjunto de regras determina como deve ser criado um filme, entre elas: ausência de cenário, utilização de som, iluminação naturais e câmera na mão. Opõe-se a ideia de autor, de cinema individual e efeitos especiais. Ou seja, é o dito cinema arte que foge completamente das ilusões criadas pelo cinema comercial.
O pensamento que surge ao assistir "Dogville" é de que por trás de uma generosidade pode haver, na verdade, arrogância e interesses puramente egoístas. Os seres humanos são multifacetados!

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